Alunos com alto patrimônio e 18 mil matrículas suspeitas levantam dúvidas sobre bolsas universitárias em SC

Após denúncias de possíveis fraudes no programa Universidade Gratuita, oferecido pelo governo de Santa Catarina, o cenário da educação superior no estado entrou em foco. Segundo o Tribunal de Contas do Estado (TCE), mais de 800 estudantes com patrimônio milionário foram contemplados com bolsas de estudo. Além disso, outras 18 mil inscrições estão sob análise por inconsistências nos dados.

O relatório, apresentado em junho, acendeu o alerta para irregularidades na concessão dos benefícios. Em muitos casos, os alunos contemplados declararam renda compatível com os critérios sociais exigidos. Contudo, ao cruzar informações patrimoniais, foram identificadas famílias donas de imóveis avaliados em até R$ 30 milhões, empresas com capital de dezenas de milhões de reais, além de veículos de luxo e embarcações de alto valor.

Como funcionam os programas Universidade Gratuita e Fumdesc

Os programas foram lançados em 2023 pelo governo de Jorginho Mello (PL). Ambos têm como proposta oferecer bolsas integrais ou parciais para estudantes de baixa renda, com critérios de seleção que incluem renda per capita familiar, desemprego do aluno ou responsável, número de dependentes, naturalidade catarinense e tempo de residência no estado.

O Universidade Gratuita é direcionado a cursos oferecidos por fundações e autarquias municipais universitárias, além de entidades assistenciais sem fins lucrativos. Já o Fumdesc contempla instituições privadas, também com bolsas integrais ou parciais.

Apesar disso, segundo o TCE, foram identificadas falhas no processo de verificação das informações fornecidas pelos candidatos. Ainda que os critérios estejam estabelecidos, a fiscalização não impediu que estudantes com alto poder aquisitivo fossem contemplados.

Dados alarmantes e reações do governo

O relatório do TCE apontou, por exemplo, que 832 alunos com renda superior a R$ 1 milhão foram beneficiados. Além disso, 4.430 bolsistas apresentaram inconsistências na renda declarada, enquanto outros 1.699 têm indícios de vínculo empregatício não compatível com o perfil de vulnerabilidade exigido.

Entre os casos mais graves, aparecem estudantes cujas famílias são proprietárias de carros de luxo avaliados entre R$ 547 mil e R$ 735 mil, além de lanchas e motos aquáticas com valores entre R$ 80 mil e R$ 202 mil. Há ainda grupos familiares com empresas que possuem capital social de até R$ 21 milhões.

Em resposta, o governo do estado anunciou, nesta terça-feira (24), durante audiência na Assembleia Legislativa, medidas para reforçar o controle sobre os programas. Segundo a Secretaria da Educação, será criado um portal da transparência com informações detalhadas sobre os beneficiários e os recursos aplicados.

Investigações em andamento

Além das ações administrativas, o governo solicitou à Polícia Civil o acesso ao relatório do TCE. O objetivo é investigar se houve uso de documentos falsos ou intermediação por consultorias informais, que cobrariam pelo “acesso facilitado” às bolsas.

A Delegacia de Defraudações vai conduzir a apuração. Paralelamente, a Controladoria-Geral do Estado (CGE) e a Secretaria da Educação estão cruzando dados de diversos sistemas para identificar outros indícios de irregularidade.

Segundo o TCE, as falhas não recaem apenas sobre os estudantes, mas também sobre as instituições de ensino e os próprios mecanismos de controle do governo estadual. O relatório final será enviado ao Ministério Público e à Receita Federal, o que pode resultar em responsabilizações civis e criminais.