Uma terapia que custa até R$ 3 milhões por paciente pode, surpreendentemente, gerar economia e salvar mais vidas. É o que mostra um estudo da Universidade Federal do Paraná (UFPR), publicado no Journal of Medical Economics e apresentado no Congresso Brasileiro de Hematologia.
A pesquisa, conduzida pelo oncologista Samir Nabhan, avaliou o impacto clínico e financeiro da terapia celular CAR-T em pacientes com linfoma difuso de grandes células B — um dos tipos mais agressivos de linfoma não Hodgkin. Apesar do alto custo inicial, o uso precoce da terapia reduz o risco de recidiva e os gastos com novas internações.
Como funciona a terapia CAR-T
A CAR-T é uma imunoterapia que utiliza as próprias células de defesa do paciente. Elas são coletadas do sangue, modificadas em laboratório para reconhecer o câncer e, depois, reinfundidas no corpo. Assim, passam a agir como “caçadoras” das células doentes.
“É como dar um novo código às células para que elas identifiquem e destruam o tumor”, explica Ana Rita Fonseca, do Hospital Sírio-Libanês.
No Brasil, a Anvisa já aprovou o uso da CAR-T para tratar linfomas e leucemias que não respondem a outras terapias. Hoje, estão disponíveis três versões: axi-cel, tisa-cel e cilta-cel.
Quando o caro sai mais barato
O estudo comparou a CAR-T com terapias tradicionais, como quimioterapia, transplante e anticorpos biespecíficos. Mesmo com custo inicial alto, a tecnologia apresentou melhor custo-benefício quando aplicada mais cedo no tratamento.
Usar a CAR-T antes de outras opções pode gerar economia de até R$ 1,3 milhão por paciente. Além disso, reduz internações e evita novas terapias caras. “Cada recidiva encarece o tratamento e diminui as chances de cura”, ressalta Nabhan.
Impacto clínico e desafios
Com a terapia, as taxas de cura aumentaram de 20% para até 60% em dois anos. Esse avanço representa uma mudança importante na luta contra o câncer. “Estamos curando de 30% a 40% a mais de pacientes”, afirma o médico.
Entretanto, o acesso ainda é limitado. O tratamento depende de tecnologia importada e de centros altamente especializados. Atualmente, ele está disponível apenas na rede privada e ainda não foi incorporado ao SUS.
Pesquisas da Fiocruz e do Instituto Butantan buscam desenvolver versões nacionais da CAR-T. Produzir parte do processo no país poderia reduzir custos e ampliar o acesso. “Fabricar etapas no Brasil é essencial para democratizar essa tecnologia”, avalia o oncologista Stephen Stefani, do grupo Oncoclínicas.
Para Nabhan, o desafio é enxergar o valor da terapia além do preço. “Ela é cara, mas custo-efetiva. Reduz recidivas, aumenta a sobrevida e representa um investimento real no tempo de vida dos pacientes”, conclui.
