Expansão de data centers no Brasil pode agravar desigualdade no acesso à energia

Enquanto milhões de brasileiros convivem com apagões frequentes e infraestrutura precária, o Brasil se tornou um dos principais polos para a construção de data centers, atraindo investimentos bilionários de gigantes da tecnologia como Amazon e Microsoft. O crescimento acelerado dessa indústria, impulsionado pela digitalização da economia e pela demanda global por armazenamento e processamento de dados, gera preocupações sobre o impacto no já fragilizado sistema energético do país.

Em comunidades isoladas da Amazônia, como o município de Novo Aripuanã, a eletricidade é um bem escasso. Lá, famílias dependem de um único gerador a diesel, ligado apenas por quatro horas à noite, devido ao alto custo do combustível. Para agricultores como Deodato Alves da Silva, essa limitação reduz sua capacidade de armazenar e vender frutas típicas da região, como cupuaçu e tucumã. Segundo ele, a falta de energia impacta diretamente sua renda, impedindo a conservação da produção.

Apesar de o Brasil ter uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo, a dependência da energia hidrelétrica torna o fornecimento vulnerável a períodos de seca. Estudos apontam que o consumo de eletricidade crescerá mais de 30% até 2050, o que pode agravar os apagões e aumentar a necessidade de usinas termelétricas, mais caras e poluentes.

Estado atual do Brasil

Atualmente, o país já abriga 60 data centers, e outros 46 estão em construção ou planejamento, segundo a Associação Brasileira de Data Centers (ABDC). A demanda vem do crescimento do e-commerce, do streaming e de aplicações de inteligência artificial, além da necessidade de grandes empresas armazenarem dados localmente para reduzir atrasos na transmissão.

As preocupações ambientais também são grandes. Especialistas alertam que a instalação desses centros exige desmatamento, construção de acessos e maior consumo de água, essencial para o resfriamento dos servidores.

“Esses sistemas consomem mais água do que pequenas cidades”, explica Vinícius Oliveira, do Instituto de Energia e Meio Ambiente.

Mesmo com esses desafios, o governo vê a expansão dos data centers como um avanço tecnológico e uma oportunidade para consolidar o Brasil como um hub digital na América Latina. No entanto, a rápida expansão contrasta com a realidade de milhões que vivem sem acesso adequado à energia elétrica.

Para pesquisadores como Elaine Santos, da Universidade de São Paulo, a desigualdade energética precisa ser considerada.

“Se as empresas constroem data centers em regiões onde a população sequer tem acesso à eletricidade, elas devem oferecer compensações significativas”, afirma.

O crescimento dessa indústria levanta uma questão crucial: até que ponto a digitalização do Brasil pode ocorrer sem aprofundar as desigualdades no acesso a um recurso básico como a eletricidade?