O Superior Tribunal de Justiça decidiu, por unanimidade, negar o pedido da farmacêutica Novo Nordisk para estender a patente da semaglutida, o Ozempic, no Brasil. A decisão mantém o prazo original de validade, que expira em março de 2026. A substância é o princípio ativo de medicamentos como Ozempic e Rybelsus, usados no tratamento do diabetes tipo 2 e, cada vez mais, da obesidade.
O julgamento era acompanhado de perto pelo setor de saúde e pela indústria farmacêutica. Caso a prorrogação fosse aceita, a exclusividade poderia se estender até 2038, o que atrasaria por mais de uma década a chegada de versões genéricas ao mercado brasileiro.
Por que a decisão do STJ é relevante
Na prática, o tribunal seguiu um entendimento já consolidado pelo Supremo Tribunal Federal. Desde 2021, o STF considera que não existe base legal para prorrogar patentes no país em razão de atrasos administrativos do Instituto Nacional da Propriedade Industrial. A legislação brasileira prevê 20 anos de proteção, sem mecanismos automáticos de compensação.
A Novo Nordisk alegava que o exame do pedido demorou além do razoável e que esse tempo deveria ser “devolvido” em forma de extensão. O STJ, no entanto, avaliou que esse tipo de ajuste não está previsto em lei e não pode ser aplicado por decisão judicial.
O que muda para pacientes e consumidores
Nada muda de forma imediata. A patente segue válida até março de 2026, o que significa que, até lá, apenas a Novo Nordisk pode comercializar medicamentos à base de semaglutida no país.
Depois desse prazo, o cenário tende a se transformar rapidamente. Laboratórios concorrentes já têm versões genéricas e similares em análise na Anvisa. Com mais opções no mercado, especialistas apontam que os preços podem cair em torno de 30% ou mais, a depender do nível de concorrência. Hoje, uma única caneta pode custar cerca de R$ 1 mil.
Atualmente, o Sistema Único de Saúde não oferece medicamentos específicos para o tratamento da obesidade. O custo elevado é o principal entrave. Segundo estimativas do Ministério da Saúde, a incorporação da semaglutida, nos valores atuais, poderia gerar um impacto anual de cerca de R$ 8 bilhões.
Com a entrada de genéricos mais baratos, esse cenário pode mudar. A pasta já pediu à Anvisa prioridade na análise de aproximadamente 20 pedidos envolvendo semaglutida e liraglutida. A ideia é garantir que, quando a patente cair, o mercado esteja preparado para ampliar a oferta e pressionar os preços para baixo.
Um problema de saúde pública crescente
O debate ocorre em um contexto delicado. No Brasil, sete em cada dez adultos estão acima do peso, e cerca de 31% já vivem com obesidade. Entre a população que depende do SUS, o avanço é ainda mais rápido.
Hoje, o tratamento público se concentra nas consequências da obesidade, como diabetes e hipertensão. Medicamentos não fazem parte da estratégia. A cirurgia bariátrica é a principal alternativa disponível, mas o acesso é restrito e representa apenas uma pequena parcela dos procedimentos realizados no país.
Críticas e próximos passos
Representantes da indústria farmacêutica afirmam que a impossibilidade de compensar atrasos reduz o tempo efetivo de proteção das patentes e pode desestimular investimentos em inovação. Em nota, a Novo Nordisk lamentou a decisão e defendeu mudanças no marco legal de propriedade industrial para garantir maior previsibilidade.
Até março de 2026, o mercado segue sob exclusividade. Nesse intervalo, órgãos reguladores, o Ministério da Saúde e laboratórios nacionais se organizam para um cenário pós-patente que pode ampliar o acesso ao tratamento e alterar de forma significativa o mercado de medicamentos no Brasil.
