A edição do Sisu 2026 deve mudar o equilíbrio das notas de corte em universidades públicas brasileiras. Pela primeira vez, o programa permitirá o uso das notas das três edições mais recentes do Enem — 2023, 2024 e 2025 — o que, segundo especialistas, tende a tornar o processo mais competitivo, especialmente nos cursos mais disputados, como medicina, direito e engenharia.
Para o diretor de ensino do SAS Educação, Ademar Celedônio, a nova regra empurra “o topo da curva para cima”. Segundo ele, os candidatos poderão escolher sua melhor nota entre três tentativas, o que amplia a média geral dos resultados.
“O funil deixa de ser de uma geração e passa a ser de três, com a melhor versão de cada pessoa. Em termos práticos, fica mais difícil entrar nos cursos já difíceis”, afirmou.
Nos cursos de menor concorrência, a tendência é de estabilidade ou até leve queda nas notas de corte, já que parte dos candidatos optará por tentar vagas mais competitivas. “Os alunos terão mais opções e poderão ajustar suas escolhas de forma mais estratégica”, explicou Zeid Sakr, head de operações das Escolas SEB.
Efeitos emocionais e desigualdades
A mudança também deve afetar o psicológico dos estudantes. Para veteranos, o impacto tende a ser positivo, reduzindo a pressão de um único exame.
“Diminui essa lógica cruel do tudo ou nada”, afirma Celedônio. Raul Toledo, coordenador pedagógico do Poliedro Curso SP, concorda: “É um fator que reduz a ansiedade de quem já vem tentando há anos.”
Por outro lado, os novatos devem enfrentar maior tensão, pois disputarão com candidatos mais experientes. “O aluno que está fazendo o Enem pela primeira vez vai competir com veteranos que já conhecem o processo e têm mais maturidade”, observa o professor do SAS.
Além disso, a mudança foi anunciada perto das provas, o que, segundo o professor Rodrigo Magalhães, da Plataforma AZ, “aumenta a ansiedade e cria insegurança entre os estudantes”.
No campo social, há divergências. Para Heitor Ribeiro, coordenador do Curso Anglo, a nova regra democratiza o acesso. “Mais pessoas terão chance de disputar uma vaga, inclusive quem não pôde fazer a prova em um dos anos anteriores.” Já Celedônio acredita que a mudança reforça desigualdades.
“Quem pode bancar cursinho por vários anos acumula vantagem. Isso favorece quem tem mais recursos financeiros”, avalia.
Efeitos nas vagas e no sistema
Especialistas apontam que a ociosidade de vagas pode diminuir, já que haverá mais candidatos concorrendo. No entanto, também pode crescer o número de trocas de curso entre alunos já matriculados, o que gera abandono de vagas anteriores. “Com mais opções, será natural que alguns decidam mudar de área”, diz Magalhães.
Outro desafio será técnico. O Sisu já enfrentou falhas em edições anteriores, e a integração de notas de três anos diferentes pode aumentar a complexidade do sistema. Ainda assim, o Ministério da Educação afirma que o mecanismo foi preparado para a mudança.
As notas de corte, definidas pela Teoria de Resposta ao Item (TRI), continuarão permitindo a comparação entre provas de diferentes anos, o que garante, em tese, a equivalência entre as edições do Enem.
