Mensagens em poder da Polícia Federal expõem a frieza com que suspeitos antecipavam fiscalizações e davam o tom das ordens. Em um chat, um investigado escreveu: “Pistola na cintura e diesel, pai”. Em outro, avisou: “Já tá tudo parado, né? Que a gente sabia que ia começar”.
Segundo a PF e o Ministério Público, a engrenagem movimentou bilhões no setor de combustíveis, com braços em portos, usinas, distribuidoras, transportadoras, fintechs e fundos de investimento.
De acordo com a investigação, o objetivo era simples e devastador: adulterar gasolina e etanol, ganhar escala logística e, por fim, lavar o dinheiro no mercado financeiro.
A Receita Federal estima que a facção chegou a influenciar cerca de 1,2 mil postos pelo país. Enquanto isso, sete etapas descrevem o caminho do dinheiro, do cais ao coração da Faria Lima.
Como operava a engrenagem do PCC, do porto à Faria Lima
Etapa 1 — Porto de Paranaguá. O ponto de partida, segundo a PF, era a importação clandestina de metanol e nafta. Produtos “químicos” que deveriam abastecer indústrias eram desviados para adulteração. O metanol, altamente tóxico, apareceu em proporções perigosas.
Etapa 2 — Usinas. A quadrilha comprou usinas endividadas no interior paulista para dar lastro às operações. Parte da cana, afirmam os investigadores, foi paga acima do preço de mercado. Assim, o esquema lavava recursos e alimentava sua própria rede.
Etapa 3 — Distribuidoras. Empresas como a sediada em Jardinópolis ganharam tração súbita. Sem faturamento relevante até 2019, chegaram a cifras próximas de R$ 800 milhões em 2021. Parte dos valores, segundo a apuração, foi parar em contas de executivos agora alvos da Justiça.
Etapa 4 — Transportadoras. Caminhões ligados a operadores do grupo cruzavam estados com carga adulterada. Ao mesmo tempo, redes sociais exibiam rotinas motivacionais das empresas de logística. Porém, por trás dos vídeos, havia itinerários e notas frias.
Etapa 5 — Postos. A rede criminosa, de acordo com fiscais, alcançou a casa de milhares de estabelecimentos. Em auditorias, a ANP encontrou, em alguns casos, até 50% de metanol na gasolina e 90% no etanol. Consumidores pagavam mais por um combustível que não atendia às normas.
Etapa 6 — Fintechs. O dinheiro circulava em “contas bolsão”, o que dificultava o rastreio. Uma instituição de pagamento sediada na Grande São Paulo, dizem os autos, movimentou R$ 46 bilhões em cinco anos. Dessa maneira, os valores “perdiam” a origem.
Etapa 7 — Fundos. O circuito se encerrava na Faria Lima. Gestoras administravam dezenas de fundos, hoje com cerca de R$ 30 bilhões bloqueados. Para a força-tarefa, a estrutura criou, na prática, um paraíso fiscal doméstico.
Investigações e foragidos
Parte dos alvos segue procurada. Entre eles, o empresário conhecido como “Beto Louco”, apontado como um dos maiores adulteradores do país. A defesa nega vínculo com o PCC. Promotores e delegados, por sua vez, afirmam que a megaoperação deu um recado: o “andar de cima” também será responsabilizado. As denúncias avançam, e novas quebras de sigilo podem ampliar a rota do dinheiro.