A polarização política é parte integrante das disputas eleitorais e, por vezes, pode ser benéfica. É crucial compreender quais agendas você apoia e quem está ao seu lado nas lutas importantes.
No Brasil, a extrema direita tem ganhado força nos últimos anos. Não apenas a designação “extrema direita”, mas também sua presença, influência e ataques ao meio ambiente e aos direitos básicos. Os brasileiros hoje estão familiarizados com o termo e geralmente sabem se concordam ou discordam de suas posições, particularmente o negacionismo e o conservadorismo.
A tragédia no estado do Rio Grande do Sul, por exemplo, está totalmente relacionada ao negacionismo climático e ambiental, um negacionismo que rejeita estratégias coletivas para enfrentar questões sociais, especialmente quando se considera que ameaçam seu estilo de vida, conforto financeiro e liberdade econômica.
No Brasil, o negacionismo está intimamente associado aos interesses do agronegócio e atividades extrativistas, paralelamente ao fato de que o conservadorismo esvazia agendas relevantes para grupos minoritários, como os direitos das mulheres, direitos LGBT+ e também os direitos dos trabalhadores.
Na América Latina, esse sentimento está ressurgindo. Embora tenhamos derrotado Jair Bolsonaro (mas não o bolsonarismo) no Brasil, a consequência da vitória de Javier Milei na eleição presidencial argentina de 2022 é que a onda neofascista continua forte.
Esta semana, o governo de extrema direita de Milei reprimiu com gás lacrimogêneo manifestantes que protestavam contra o projeto de lei conhecido como Lei das Bases, um pacote de medidas ultraliberais do presidente. Várias pessoas ficaram feridas.
Nas últimas semanas, os avanços e retrocessos da direita na Europa têm sido assunto de várias reportagens, especialmente devido às eleições do Parlamento Europeu, que terminaram em 9 de junho. Na União Europeia, esta votação serve como um termômetro para a política nacional — e o inimigo do bloco é a extrema direita.
Ao longo da história da UE, a esquerda radical perdeu seu monopólio, abrindo espaço para a extrema direita, que ganhou força com a crise do Euro, quando setores que concentram renda ganharam apoio e as pessoas mais vulneráveis tiveram que lidar com cortes nos orçamentos de saúde e educação.
O que se viu nas eleições parlamentares deste ano foi um deslocamento para a direita. O partido esperado para vencer é o Partido Popular Europeu, um grupo político formado por vários partidos de centro-direita em um grande movimento contra as leis ambientais, incluindo a chamada bancada verde, que perdeu representação. O agronegócio e os anti-imigração estão se sentindo representados, e o atual aumento da extrema direita é talvez um fenômeno global.
A Alemanha, por exemplo, é um país onde a extrema direita aumentou o número de assentos no Parlamento Europeu, com o partido Alternativa para a Alemanha (AfD, na sigla em alemão) alcançando seu melhor resultado de todos os tempos nas eleições europeias, graças ao racismo anti-muçulmano, ligado ao sionismo.
Na França, o presidente Emmanuel Macron dissolveu a Assembleia Nacional do país e marcou novas eleições após perder a eleição do Parlamento Europeu para o partido de extrema direita Reunião Nacional (Rassemblement National, em francês).
Em um anúncio televisivo, Macron disse que “a ascensão dos nacionalistas e demagogos é um perigo não apenas para nossa nação, mas também para a Europa e para o lugar da França na Europa e no mundo.”
O avanço do neoliberalismo e a repressão aos movimentos populares e às populações imigrantes em países como França, Itália e Alemanha refletem o crescimento da extrema direita no Parlamento Europeu.
Para o jornalista Jamil Chade, correspondente brasileiro em Genebra, Suíça, essa onda de visões de extrema direita na Europa é um reflexo de uma “crise existencial” que assola o continente desde o colapso financeiro de 2008.
“Essa situação resulta de uma política neoliberal brutal e da repressão de todos os movimentos sociais por vários anos […]. Isso colocou a classe trabalhadora em uma situação muito difícil na França […]. Nessa situação, as pessoas estão expressando seu sofrimento votando na extrema direita,” disse Morgan Ody, coordenador geral da Via Campesina na Europa.
Nesse cenário, a grande vitória da extrema direita europeia é que ela aumentou sua visibilidade e moveu o eixo político de gravidade ao atrair o centro para si. Como eu disse anteriormente, a extrema direita está ganhando conhecimento e peso.
Mas há outro lado nisso: na Bélgica, por exemplo, o Partido dos Trabalhadores, de orientação marxista, ganhou mais espaço, mas o primeiro-ministro Alexander De Croo renunciou após os resultados da votação parlamentar.
Também é notável o desempenho de partidos como a Aliança de Esquerda da Finlândia, o Partido Popular Socialista da Dinamarca e o Partido da Esquerda da Suécia, cujas siglas descendem de movimentos comunistas.
Mesmo na França, há um movimento para conter o avanço da extrema direita na UE, com a defesa da unidade e a formação de uma frente popular. “Os resultados nos forçam – as organizações de esquerda – a nos unirmos para deter a extrema direita,” disse Hélène Le Cacheux, líder do Partido de Esquerda, ao Brasil de Fato. “Devemos nos unir para lutar contra a extrema direita.”
Enquanto os extremistas de direita têm objetivos claros, a esquerda não possui um projeto atual para uma realidade diferente ou pelo menos reformas profundas no modelo atual. Para derrotar o cinismo da direita, precisamos que a esquerda enfrente os desafios colocados e apresente um novo projeto de sociedade alinhado com as demandas deste século.
No Brasil e na América Latina, assim como na Europa: da unidade à criação de projetos concisos e organizados, precisamos agir e evitar que retrocessos engulam direitos básicos conquistados há muitos anos. Notícias como as vistas esta semana devem servir de exemplo do que não queremos e devemos combater.