Agricultores da cidade de Caetité, na Bahia, onde está localizada a única mina de urânio ativa do Brasil, relatam dificuldades diárias devido à contaminação da água. A reportagem do Fantástico revelou como o impacto ambiental tem afetado diretamente a saúde, a economia e a vida social da comunidade local.
Luziene, agricultora da região da Gamileira, compartilhou o estigma que passou a enfrentar após a descoberta da contaminação por urânio na água de sua propriedade.
“A gente fazia farinha, mas até para vender era difícil. Quando falavam que era da Gamileira, ninguém queria. Era urânio. Às vezes vinham as visitas na casa da gente e nem água queriam. Com medo”, contou.
A origem do problema foi um poço perfurado pela Indústrias Nucleares do Brasil (INB) para prospecção mineral na área da propriedade. Após três anos de uso, o poço foi lacrado, pois o teor de urânio na água atingiu 30 vezes o limite seguro para consumo humano. “Usamos essa água para os animais e para molhar a planta”, relatou Luziene, preocupada com os efeitos a longo prazo.
Saúde em risco e falta de monitoramento
Em 2012, um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) já havia identificado uma alta incidência de cânceres relacionados à exposição à radioatividade em Caetité e municípios vizinhos. No entanto, até o momento, não foram realizadas pesquisas de longo prazo para monitorar a saúde da população ou estabelecer uma relação direta entre a contaminação por urânio e o aumento de doenças na região.
A ausência de acompanhamento contínuo preocupa os moradores, que enfrentam o medo constante de problemas de saúde decorrentes da exposição prolongada à radioatividade.
A mina de urânio está paralisada desde 2024, após o governo revogar o contrato com a empresa responsável pela extração. No entanto, o pátio onde o minério já extraído está armazenado permanece cheio, e a poeira radioativa levantada pelo vento representa mais um perigo para a população local.
De acordo com normas ambientais, toda a água da chuva que entra em contato com o material radioativo precisa ser captada e armazenada em um local seguro. Contudo, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) interditou o pátio, alegando que não há um sistema de drenagem adequado para impedir o espalhamento da água contaminada.
Comunidade entre o medo e a incerteza
Além das questões de saúde, o impacto econômico também é significativo. Agricultores como Luziene enfrentam dificuldades para vender seus produtos devido à associação com a contaminação por urânio. A desconfiança de compradores e a estigmatização da região agravam ainda mais a situação econômica da comunidade.
Apesar dos desafios, a população de Caetité segue buscando soluções e cobrando respostas das autoridades. O caso ressalta a importância de políticas públicas que garantam o monitoramento contínuo da saúde da população, o controle ambiental rigoroso e a reparação dos danos causados pela atividade mineradora.
A história de Caetité reflete o dilema enfrentado por muitas comunidades ao redor do mundo: o equilíbrio entre o desenvolvimento econômico, a exploração de recursos naturais e a preservação da saúde e do meio ambiente.