O escritório Pogust Goodhead, responsável pela ação coletiva bilionária contra a mineradora BHP no Reino Unido, aceitou discutir um acordo de apenas US$ 1,4 bilhão para encerrar o processo — valor bem inferior ao que as vítimas da tragédia de Mariana poderiam receber no Brasil. O detalhe mais alarmante: os autores da ação não foram informados dessa proposta mais baixa, segundo revelou reportagem da Folha de S.Paulo com base em fontes próximas às negociações.
A proposta foi colocada à mesa em junho, em uma reunião realizada em Nova York, da qual participaram representantes da BHP, da Vale e os financiadores americanos da ação, o fundo Gramercy. Ainda de acordo com a reportagem, os advogados britânicos negociavam cerca de US$ 800 milhões para as vítimas e US$ 600 milhões para cobrir despesas jurídicas. O número está muito distante dos R$ 155 bilhões (cerca de US$ 30 bilhões) que a BHP e a Vale já se comprometeram a pagar no Brasil, segundo acordo firmado com autoridades públicas.
Apesar disso, os advogados do escritório inglês seguiram afirmando publicamente que as famílias brasileiras poderiam receber “dezenas de bilhões de dólares” em Londres. Em fevereiro deste ano, por exemplo, o então CEO Tom Goodhead declarou que as mineradoras “ainda deviam dezenas de bilhões às vítimas”, promessa que jamais foi formalizada junto ao Judiciário britânico.
Omissões e pressão interna abalam confiança na ação
A revelação da Folha ocorre poucos dias após a saída de Tom Goodhead do comando do Pogust Goodhead, substituído de forma abrupta após atritos com o próprio fundo financiador do caso. Fontes ligadas ao processo afirmam que parte dos investidores já temia os riscos de reputação e o impacto de possíveis exposições públicas.
Nos bastidores, a insatisfação crescia. Segundo relatos ouvidos pela Folha de S.Paulo, muitos dos autores do processo não sabiam que seus advogados estavam dispostos a aceitar valores muito inferiores aos da reparação brasileira, e só foram informados da negociação pela imprensa.
A decisão de manter o valor real das tratativas em sigilo gerou forte repercussão entre vítimas, lideranças locais e membros da sociedade civil envolvidos com o caso Mariana. A percepção é de que houve um apagamento das possibilidades de indenização justa no Brasil em troca de um processo internacional mais lento, mais incerto e, agora, potencialmente menos vantajoso.
Além disso, o acordo britânico sequer está fechado. A ação segue em julgamento, com decisão prevista para os próximos meses. Ainda que a BHP seja condenada, o valor final de uma possível indenização só será definido em outro julgamento, marcado para 2026.