Cidade menor de Roraima afunda em dívidas e escândalos com obras paradas

Com pouco mais de 7 mil habitantes, São Luiz, no sul de Roraima, tornou-se símbolo de desperdício de dinheiro público e descontrole administrativo. A menor cidade do estado acumula ao menos seis grandes obras paralisadas, um rombo de R$ 38 milhões nos cofres municipais e mais de R$ 103 milhões recebidos em emendas parlamentares que hoje estão sob investigação.

Durante quatro anos, de 2021 a 2024, a gestão do ex-prefeito James Batista (SD) atraiu recursos federais e estaduais em ritmo acelerado, mas deixou um rastro de construções inacabadas e dívidas com fornecedores, incluindo até funerárias. Em janeiro de 2025, o atual prefeito, Chicão (PP), decretou estado de calamidade financeira, que expira no fim de julho.

Mesmo com o decreto em vigor, a nova gestão também passou a ser investigada pelo Ministério Público de Contas (MPC) por supostos desvios de R$ 7,4 milhões. O órgão pediu o afastamento de Chicão, mas o Tribunal de Contas de Roraima ainda não analisou o caso.

Obras milionárias, prazos estourados e dinheiro sem destino

Entre os projetos abandonados, destacam-se o parque de vaquejada de R$ 13,7 milhões, um conjunto habitacional de R$ 12,3 milhões e uma escola de R$ 2,7 milhões. A construção mais visível — e polêmica — é o portal de entrada da cidade, com 26 metros de altura e orçamento de R$ 2,16 milhões. A obra está parada há quase três anos.

Somadas, as obras interrompidas já custaram cerca de R$ 36 milhões aos cofres públicos. Enquanto isso, moradores enfrentam o abandono de equipamentos públicos e a precariedade dos serviços de saúde, como revela a única Unidade Básica de Saúde da sede da cidade, onde pacientes são atendidos no estacionamento e lixo hospitalar se acumula dentro da unidade.

A nova UBS, prometida para agosto de 2022, também está abandonada, com o mato sendo removido por moradores para evitar proliferação de insetos.

Emendas milionárias e suspeitas de desvio

Durante a administração de James Batista, São Luiz recebeu 41 emendas federais via PIX, mecanismo criticado por dificultar a fiscalização, e mais duas estaduais, que também viraram alvo de CPI na Assembleia Legislativa de Roraima. A prefeitura teria movimentado os recursos sem autorização legal e, em um dos casos, redirecionou verbas para empresas suspeitas.

A CPI apura se houve fraudes em processos de licitação, com relatos de servidores que afirmam terem sido obrigados a interromper editais de forma irregular. Empresas como Techmix e Atenas, responsáveis por parte das obras paradas, também são alvos das apurações.

Entre os parlamentares que mais enviaram recursos à cidade estão nomes já envolvidos em outros escândalos: Telmário Mota, ex-senador preso por crimes graves, enviou R$ 26,8 milhões; Chico Rodrigues, conhecido por ser flagrado com dinheiro na cueca, destinou R$ 19,2 milhões; e o deputado Nicoletti repassou R$ 5 milhões.

Os parlamentares alegam que a responsabilidade pelo uso das verbas é da prefeitura. No entanto, moradores da cidade não escondem a revolta diante de tanto dinheiro investido sem retorno prático.

Para muitos, São Luiz virou uma cidade repleta de “elefantes brancos”, como desabafou o autônomo Paulo Rodrigues:

“Estamos sem esperança. Todo mundo por aqui comenta que São Luiz deveria estar na África do Sul, porque é lá que tem elefante. Aqui, só tem obra abandonada”.