Brasileiros recebem 10 bilhões de ligações de robôs por mês: como funcionam os disparos que abrem caminho para fraudes

As chamadas automáticas, conhecidas como robocalls, se tornaram parte do cotidiano no Brasil — e também um grande problema.

De acordo com a Anatel, 20 bilhões de ligações são disparadas todo mês no Brasil. Metade delas, cerca de 10 bilhões, é feita por sistemas automáticos que testam linhas ativas em segundos. Se a chamada for atendida, significa que a linha está “viva” e pode ser alvo de vendas, golpes ou fraudes.

Durante uma investigação de um mês, o Fantástico revelou como empresas brasileiras fornecem programas que fazem disparos automáticos para milhares de números por segundo, muitas vezes usando dados pessoais obtidos ilegalmente.

Vendas de dados e “provas de vida” para golpistas

A reportagem se passou por uma empresa fictícia para contratar serviços de robocalls. Um representante ofereceu listas atualizadas com até 150 mil registros de profissionais, contendo nomes, telefones, e-mails e endereços.

Entre os alvos estava o psicólogo Matheus Arend, de Guaíba (RS), que afirmou nunca ter autorizado o uso de seus dados. Ao receber essas ligações, a vítima visualiza um número virtual — e, ao retornar, a ligação é automaticamente bloqueada.

Esse sistema permite que call centers foquem apenas em contatos válidos, otimizando o tempo dos operadores. No entanto, também abre brechas perigosas para fraudes.

O excesso de chamadas automáticas levou muitos brasileiros a simplesmente não atender mais números desconhecidos. Essa decisão, no entanto, pode ter consequências graves.

Casos como o de pacientes que perderam transplantes por não atenderem ligações da central de saúde se multiplicam. Além disso, quem busca emprego também pode deixar escapar oportunidades.

Em janeiro e fevereiro de 2025, o Brasil registrou quase 24 bilhões de robocalls — 23 mil ligações automáticas por segundo —, um aumento de 12% em relação ao ano anterior.

Golpes sofisticados com ajuda da inteligência artificial

Quadrilhas também se aproveitam da tecnologia para disparar mensagens automáticas falsas. Em testes feitos pelo Fantástico, foi criada uma ligação que simulava uma oferta de empréstimo, utilizando inteligência artificial para gerar uma voz realista.

Especialistas alertam que criminosos tentam induzir respostas como “sim” ou “não”, que podem ser gravadas e usadas em fraudes posteriores.

Além disso, sistemas de robocalls alteram DDDs para parecerem ligações locais — prática considerada crime de fraude eletrônica, com pena de até oito anos de prisão.

A Anatel afirma que trabalha para conter o abuso. Desde 2022, segundo o órgão, mais de 222 bilhões de chamadas foram bloqueadas nas redes de telecomunicações. Agora, uma nova medida de “origem verificada” está sendo implementada: o consumidor verá na tela o nome e o motivo da chamada antes de decidir atender.

Enquanto isso, especialistas recomendam nunca interagir com chamadas suspeitas e manter sempre o bloqueio de números desconhecidos.